BOLETIM IMLB

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BOLETIM NÚMERO 03 IMLB/MPMPL- REFORMA POLÍTICA DO POVO

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Nossa marolinha

O COLAPSO MUNDIAL E O BRASIL

 

Adriano Benayon – 17.12.2008

 

1. A vulnerabilidade externa

 

O Brasil sofre, de 1945 ao presente, processo de crescente subordinação à oligarquia do poder mundial, com breve e parcial interrupção de 1951 a 1953. Ao longo dos últimos 54 anos alguns setores e empresas permaneceram sob controle local ou passaram a este, mas, no conjunto, a desnacionalização, sistematicamente promovida pela política econômica, tornou-se geral a partir de 1990.

 

No artigo “Contas externas vulneráveis”, publicado em A Nova Democracia, nº 42, abril de 2008, mostrei a fragilidade estrutural da economia brasileira, acarretada pelo predomínio das empresas transnacionais:  “As crises retornam sempre, porque a política econômica, determinada de fora do País e contrária aos seus interesses, favorece as exportações intensivas de recursos naturais, agrava a inferioridade tecnológica e propicia as transferências de recursos reais e financeiros para o exterior.”

 

Demonstrei também que as reservas internacionais carecem de consistência, pois decorrem de entradas de capital estrangeiro para cevar-se dos elevados juros e demais benesses, inclusive fiscais.

 

Em “A nova crise do real” (nº 46, setembro de 2008), observei: “Para futuro não muito distante gesta-se outra crise do real e mais um desgaste insuportável para a economia brasileira semelhante ao de 1998, quando a taxa dos títulos públicos chegou a 50% aa., sem que isso tenha evitado a galopante desvalorização do real iniciada em 1999.”  E: “A recorrente vulnerabilidade das contas externas é conseqüência inelutável do modelo comandado por bancos e empresas transnacionais.

 

Sendo a vulnerabilidade crônica e estrutural, as divisas estão fadadas a sair, engordadas pelos ganhos aqui auferidos, ao se tornar crítico o déficit nas transações correntes com o exterior. Isso aconteceria mesmo sem o impacto do colapso financeiro e da depressão econômica nos EUA e Europa. De qualquer modo, um e outra aceleraram a sangria das reservas, não só porque o capital se tornou quase indisponível no exterior, mas também pela queda dos preços das commodities.

 

Tudo isso ficou manifesto no resultado negativo de US$ 7,1 bilhões no balanço de pagamentos em novembro de 2008, recorde desde 1999.  A própria balança comercial (exportações menos importações) que vinha tendo grandes saldos, caiu 12,1%, até novembro, em relação a 2007.

 

A balança havia totalizado superávit de US$ 190,2 bilhões, de 2003 a 2007, mas essa não foi a fonte principal das reservas, porquanto o balanço de transações correntes, do qual a balança comercial faz parte, se limitou, no período, a US$ 28,3 bilhões, sem as transferências unilaterais.

 

De fato, o saldo comercial foi quase que totalmente anulado pelos déficits  de serviços e de rendas (juros e lucros), com déficit de US$ 162 bilhões. Isso deixa bem claro que, apesar do volume colossal das exportações de recursos minerais e de produtos do agronegócio, as reservas, cujo grosso está ligado a capitais voláteis, não dão segurança ao Brasil.

 

Será o caso de conferir se, como creio, se dará a crise do real, ou se tem razão o dono da política econômica, aboletado no Banco Central, o qual se gaba do nível recorde de reservas (US$ 209 bilhões em 17.12.2008) e assegura que haverá crescimento econômico em 2009.

 

Ele omitiu que o recente aumento das reservas se deve ao adiantamento do Federal Reserve (FED) dos EUA (US$ 30 bilhões até abril de 2009). Como observou Cesar Benjamin, o capital de curto prazo entendeu o recado: tem alguns meses para ir embora sem grandes perdas.

 

2. A Falha estrutural

 

O Brasil já se prejudicou demais por se atar ao sistema mundial de poder e às decisões deste. Agora, o colapso financeiro e econômico mundial faz pairar sobre o País perspectiva ainda mais trágica que essa lamentável retrospectiva.

 

Livrar-se da exponenciação dos graves desequilíbrios e libertar-se dos mecanismos de saqueio só será possível sob novo quadro institucional, por sua vez, irrealizável sem a remoção das falhas estruturais. A principal delas consiste no controle dos meios de produção por empresas transnacionais sediadas no exterior e pode ser medida pelo registro no Banco Central dos “investimentos estrangeiros diretos”.

 

De 1996 e 2001, as entradas líquidas a esse título superaram os US$ 100 bilhões (ingressos de US$ 157 bilhões e saídas de US$ 56,6 bilhões). Segundo o IEDI (Instituto de Estudos para Desenvolvimento Industrial) a cifra líquida chegou a US$ 125 bilhões. O estudo desse instituto concluiu que o avultado volume de investimento direto estrangeiro teve por conseqüência o agravamento do desequilíbrio externo do País, em função dos gastos com juros, remessas de lucros e pagamentos de royalties às matrizes das transnacionais.

Em 1995 as empresas estrangeiras respondiam por 31,8% daquele déficit. Esse percentual subiu para 61% em 2000. Mais: as estrangeiras responderiam por 67% do aumento da dívida externa no período.

Há mais fatos a acrescentar à avaliação do IEDI.

 

1) Os ingressos investimentos estrangeiros diretos foram ainda maiores de 2002 a 2007 (US$ 212,9 bilhões), embora as saídas tenham se elevado em proporção ainda maior (US$ 149,7), resultando em entradas líquidas de US$ 63,2 bilhões.

2) O grosso dos lucros das transnacionais é remetido ao exterior a outros títulos que a remessa oficial de lucros, esta cresce  vertiginosamente: de US$ 16,4 bilhões em 2006 para US$ 21,3 bilhões em 2007, quantia igual a quase cinco vezes a média de 1994 a 2003 (US$ 4,3 bilhões). Em 2008, só de janeiro a setembro, a remessa oficial ascende a US$ 27,5 bilhões.

3) O grosso do capital estrangeiro no Brasil provém de recursos ganhos localmente e de subsídios governamentais.

 

3. A mentalidade das “elites”

Sem falar dos tradicionalmente alinhados ao Império anglo-americano, é  preocupante que  não avaliem adequadamente a realidade figuras destacadas dentre os não indiferentes à autodeterminação do País e à prosperidade da sociedade em seu conjunto.

Em recente seminário patrocinado pelo Governo do Paraná, disse Carlos Lessa: “A crise atual é o resultado de 25 anos de excessos, a globalização de uma superestrutura financeira, em que o produto de todos os países soma 60 trilhões de dólares, mas temos 130 trilhões de dólares em ativos primários e se crê em 540 trilhões em derivativos financeiros.

 

Na verdade, os números são ainda mais assustadores do que esses. Mas, mais importante é entender que vêm de muitos séculos os excessos dos concentradores financeiros. A origem direta dos atuais remonta a antes de 1960, quando começou a se intensificar a movimentação de ativos financeiros fora do controle dos Estados nacionais, nos refúgios fiscais offshore, a maioria em possessões britânicas e holandesas, e também em centros europeus como Londres e Zurique. 

 

Do mesmo modo, as imposições do Império no âmbito da globalização não foram as razões principais de ter sido o Brasil brutalmente saqueado nos últimos 18 anos, através das negociatas das privatizações e de n outras jogadas contra o País. Durante os mesmos 25 anos de que fala Lessa, grande número de países não sofreu da política de terra arrasada aplicada no Brasil.

 

Por que? Porque suas estruturas econômicas formadas ou reconstituídas após a 2ª Guerra Mundial,  e aí vão mais de 60 anos,  não se fizeram com base em empresas de capital estrangeiro, nem subsidiando essas empresas, como ocorreu no Brasil.

 

O empresário Eugênio Staub falou do “crescimento brilhante” do Brasil , de 1900 a 1980. Segundo ele, só não foi melhor ainda, porque a partir de 1980, perdemos o rumo,  quando o Brasil entrou na conversa do Consenso de Washington.

 

Staub não entende que só entramos nessa conversa, porque, de 1954 em diante, aumentaram as dependências financeira e tecnológica, levando a déficits de transações correntes devidos aos mecanismos de transferência dos recursos ao exterior. Daí elevou-se a dívida externa, a alavanca que fez pseudo-governos se curvar às imposições do Banco Mundial e do FMI.

 

4. A resposta das “autoridades”

 

Estas aceitam o que deseja quem tem poder de pressão. O crédito secou para as demais atividades produtivas. Empresas nacionais, além dos efeitos da crise, encalacraram-se com operações de derivativos no exterior, a que foram induzidas pelo BACEN. 

 

A resposta foi liberar R$ 56 bilhões de depósitos compulsórios dos grandes bancos, que estão comprando carteiras de bancos menores e depositando títulos públicos no BACEN, sobre os quais auferem juros de 13,75% aa. Até o início de dezembro o governo havia gasto R$ 150 bilhões “combater a crise financeira”. A maior parte para “segurar” a taxa de câmbio e financiar swaps cambiais. 

 

O economista Dércio Munhoz lembra que há R$ 150 bilhões em papel-moeda depositados no Banco Central, e a economia produtiva permanece à mingua. Os bancos públicos financiam montadoras de automóveis e fusões de empresas.

 

 

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